quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Essa noite só poderia dormir se fosse em seus braços e só poderia sonhar se fossem os seus sonhos. Vem aqui, fica comigo. Sorri de olhos fechado pra mim e me salva da escuridão.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Histórias Inventadas

A mesa do café tem dois lugares, mas ele está sozinho. Por que nunca vemos mesas para um? Estar sozinho em uma mesa para dois é ainda mais solitário que a constatação da solidão pura e simples. Estranho pensar sobre isso. E talvez esse homem meio grisalho, óculos na ponta do nariz e olhar perdido esteja pensando nisso enquanto gira a aliança na mesa. Vou criando histórias para ele como costumo criar para todos os desconhecidos que cruzam meu caminho. Talvez tenha descoberto hoje a traição da esposa com quem está casado por quinze anos e pondere entre um crime passional ou o aluguel de um outro apartamento. Pode ser também que ele tenha mantido por meses um caso tórrido com a secretária que agora apareceu grávida e ameaça destruir-lhe o casamento. Será que a esposa faleceu essa manhã de uma doença que a manteve na cama por meses e ele agora procura não sentir-se culpado pelo alívio que o invadiu de repente? Vou criando para ele passado, presente e futuro enquanto ele continua brincando com a aliança.

Escuridão

Minha cabeça dói. Dor intensa. Meu peito arde. Que inferno!!! Onde você foi parar? Onde fomos parar nós dois? Perdidos na estupidez humana que não entende de onde veio e qual é seu destino.Deixei que você fosse. Mas o que eu poderia fazer. Enfrentar? Enfrentar sua obstinação? Nunca fui capaz disso. Sempre obedeci, obedeci, obedeci cegamente.E agora? Quem vai me dar ordens? Quem vai orientar minhas ações, meus pensamentos, minhas palavras? As próximas páginas do meu livro permanecerão em branco.Você não podia. Não tinha o direito de ir embora. De não deixar pistas depois de ter devastado meu coração, meu espírito e meu corpo. Como pode virar e seguir, consciente da minha solidão e do meu desespero? Como pôde me mostrar a felicidade, tornar-la parte da minha rotina até que eu estivesse viciada e, de pronto, sem anestesia, tomá-la de mim?Não. Nunca teve por mim amor. Talvez nunca tenha tido amor por ninguém. Prefiro acreditar que não. O que faltou? O que eu não fiz? Essas perguntas sem respostas me enlouquecem.Olho pela janela. Trinta ou quarenta metros me separam do fim desse tormento. Será como se eu nunca houvesse existido. Não existirão mais perguntas, nem dor, nem desespero. Só alívio.Lanço-me. Mergulho no nada. Imaginei que fosse acabar mais rápido. Minhas lágrimas secam com o vento. Vejo você dentro de mim antes que tudo se apague.

domingo, 26 de outubro de 2008

Insonia

Não posso dormir. É madrugada, o dia lá fora ensaia o amanhecer enquanto um silêncio paciente preenche a casa toda. Faz calor e não encontro o aconchego necessário para descansar. Os olhos pesam mas o coração salta dentro do peito com força. Há poucas horas houve momentos em que não podia precisar onde terminava meu corpo e começava o seu. Ainda agora tenho as pernas trêmulas e o teu gosto na boca. Fecho os olhos e encontro seu queixo apoiado no meu ombro, o hálito quente soprando meu rosto, um dos braços na minha cintura. Vou tentar dormir outra vez.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Presente cor de rosa

Dentro do carro, no estacionamento do prédio, ela interrompe o beijo e sussurra no ouvido dele “tenho um presente pra você”. Meio a contragosto ele olha pra ela e espera uma camiseta ou um CD novo, mas ela afasta as pernas levemente, escorrega as mãos pelas pernas e tira a calcinha cor de rosa, “é sua”.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Como passarinho

Seus olhos são tão calmos, tão profundos, tão serenos. Perco a mim mesma detro deles. Não posso resistir, mergulho num não sei quê que me puxa e me prende até eu não mais responder por mim. Quase uma doença. Um vírus que me consome. Eu tento desviar o olhar mas uma angústia lancinante toma conta do meu corpo, a cabeça rodopia e quando me dou conta lá estou eu, dentro dos seus olhos. Deixa-me ir, eu suplico, mas você não permite. Sustenta meu olhar com toda força do mundo. Eu te pertenço há tanto tempo e com tanta intensidade que não acredito mais haver vida fora do seu mundo. O cativeiro, contudo, me machuca, todo o cativeiro é sofrimento, ainda que seja o mais doce deles. Preciso ser livre mesmo que não sobreviva em liberdade, como os passarinhos nascidos na gaiola. Preciso sair de dentro desses olhos castanhos e conseguir ver novamente meus próprios olhos, maremotos e furações, angústia, ansiedade, medo. Há uma bagunça dentro de mim. No início me senti protegida dentro do seu mundo racional e organizado, agora tenho que ir, encontrar sentido na desordem do meu ser. Abre seus olhos, amor, e deixa-me ir.


sábado, 18 de outubro de 2008

sem título... aceito sugestões

Ele tem um sorriso que brilha. Nunca conheci um homem com um sorriso tão branco que brilha. Vi pela primeira vez na fotografia. Ele me olhava por detrás do ombro esquerdo.
Depois o sorriso veio na minha direção, abrindo-se e ofuscando-me. Que lindo. Apaixonante. Disse mil coisas só com um sorriso. Fiquei encantada. Agora tenho medo.

Danielle Gomes

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Porque a vida é doce

Eu já fiz um desenho que virou quadro.Estive acima das nuvens.Brinquei de esconde-esconde.Construí uma cidade de lego.Pintei uma paredeWillian e eu já brincamos de cavalinho nas costa de nosso pai.Prometi casamento a uma mulher.Amei sem ser amado.Brinquei de papai e mamãe só pra passar a mão nas meninas.Peguei ônibus errado.Vi um filme sozinho na sala do cinema.Ganhei uma medalha de ouro.Dei um beijo com mais de 10 minutos.Passei mais de 3 minutos debaixo d’águaPassei em 2º lugar em uma prova.Tive medo do escuroApaixonei-meJantei num restaurante chique.Mostraram-me o centro de São Paulo inteiro.Chorei depois de ver um filme.Queria ser arquiteto.Fui a um motel.Pulei d’uma ponte no rio.Acordei assustado de um pesadelo.Comi uma bacia inteira de batata-frita.Ouvi um Eu te amo.Dormi deitado na grama.Vi uma pessoa morta.Atravessei o rio numa canoa.Cometi uma loucura.Andei de skate.Forjei a assinatura da minha mãe pra não pegar suspensão.Estive no Amazonas.Chorei por amor.Estive numa praia deserta.Briguei na escola.Errei.Desejei a mulher do próximo.Uma vez consegui tirar um A na escola.Arrependi-me de algo que fiz.Contei estrelas.Conheci uma pessoa que mudou minha vida.Fiz uma cabana.Julguei o livro pela capa.Acampei.Ganhei um diploma.Viajei de ônibus.Dormiram no meu braço.Atravessei uma grande piscina a nado.Escondi-me debaixo da cama para não ir pra escola.Desci em ponto errado só pra ver uma pessoa.Estive no Amapá.Pulei o muro pra cabular aula.Bebi uma garrafa de vinho.Peguei um avião para arriscar a vida.Ganhei um jogo muito importante.Encontrei um bom emprego.Pedi perdão.Engoli chiclete só pra ver se grudava nas tripas.Vi o Rappa tocando na minha frente.Fui à praia e voltei com 30 reais no bolso.Assei batata na fogueira.Perguntei que horas eram só pra puxar papo.Soltei pipa.Peguei o carro e saí sem destino.Amei mais que a mim mesmo.Li um livro.Estive na Paraíba.Tive preconceito.Arrependi-me de algo que disse.Nadei pelado.Mostraram-me o desconhecido.Formei-me na faculdade.Estive em Pernambuco.Matei um sapo.Namorei.Tive uma enorme coleção de carrinhos.Aprontei escondido.Ganhei um lago com peixe e tudo só pra mim.Elegi um lugar como sendo meu.Virei a noite estudando.Perdi uma pessoa amada.Tirei fotos nua de uma linda mulher.Joguei bola descalço.Bebi até vomitar.Perdi um amigo.Brinquei de lutinha com bonecos.Fui a uma exposição de arte.Recebi um olhar que me bambeou as pernas.Subi na escada-rolante que desce.Dormi abraçado.Cortei a mão correndo atrás de pipa.Dirigi bêbado.Beijei de ficar todo babado.Num dia de frio passei o dia todo debaixo das cobertas.Arrumei algo quebrado.Acordei de mau-humor.Recebi uma mensagem que me tirou o sono.Fui a um drive-in.Fiz um bonito gol.Ri até chorar.

Rodrigo Santos

Eterna Espera

O rapaz de olhos azuis está sentado e espera. Ele não tem livros nas mãos, nem fones nos ouvidos. Ele só espera. Olha para o nada alheio aos trens do metrô que chegam e partem. Indiferente ao ir e vir constante das pessoas. Não percebe que não consigo deixar de fixar meus olhos curiosos nele. Assim percorro as curvas do seu rosto. Tem um queixo redondo com uma covinha discreta, a testa pequena, olhos vivos de pupilas levemente dilatadas. Tem lindos lábios rosados que não se abrem um sorriso em momento algum mas que também nunca se encontram. Ele suspira fundo e finalmente volta os olhos para os pés. Parece despertar de um transe. Vira a cabeça para os lados e para cima várias vezes. Acredito que esteja certificando-se de onde está. Consulta o relógio. Novo suspiro. Levanta e entra correndo em um dos trens, depois do sinal, mas antes que as portas se fechem. Ele cansou de esperar. Eu também.

Danielle Gomes

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Wisky

Giro o copo de wisky para a esquerda e para a direita, mas a pedra de gelo, meio submersa apenas, não gira. Petulante e teimosa permanece fixa como a zombar de mim. O cheiro da bebida me enoja, tem cor e aspecto de água suja e cheira bêbado de botequim. Não sei porque coloquei aquele copo.
Ouvi alguém dizer que bebe para esquecer. No fundo não sei se quero esquecer. Acho que sou meio como essa pedra de gelo. Meio submersa em algo escuro e duvidoso que gira em torno de mim enquanto permaneço imóvel.
Levanto os olhos em direção à janela. O vento bate mas não faz barulho. É um silencio absurdo. Acho que você estaria feliz aqui no meu lugar. Silêncio e solidão. É isso que aprecia. Embora não goste de wisky assim como eu. Será que finalmente temos algo em comum? Para falar a verdade não tenho nenhuma certeza sobre o wisky. Talvez até seja sua bebida preferida.
Um brinde a você e ao seu amor por si próprio. Ah, sim. Disso estou certa. Seu amor por si mesmo é incondicional. Quem disse que você não tem amor por ninguém? É o maior amor que eu já vi na vida, amor pelo seu ego inflado e abundante.
Eu rio. Gargalhadas altas. Acho que estou meio tonta. Tento me levantar mas acabo desistindo, melhor ficar por aqui mesmo. Está tudo bem no fim. Forço um gole de wisky e percebo depois que a pedra está menor. Será que vai acontecer comigo? Será que vou diluir e desaparecer?
Foi tão melhor ter-se ido. Vai embora. Leva essa crueldade alimentada pela escuridão.
Vou filtrar tudo e manter só as boas lembranças. O dia que vi meu rosto dentro dos seus olhos. Um sorriso. Dormir no seu braço. O cheiro do seu sabonete. Vou guardar tudo isso dentro de um baú. O resto você pode levar com você. As ofensas, as lágrimas, as mentiras. Fique com tudo.
Já não há mais pedra de gelo. Só a água suja um pouco mais rala. Assim fica mais fácil beber.

Danielle Gomes

domingo, 12 de outubro de 2008

Tarde de Chuva

Hoje o dia começou difícil. Chuva pequena, mansa, ininterrupta. Chuva daquelas que não quer parar de chover. Nem tem cheiro de terra molhada porque em São Paulo nem tem mais terra, Nem tem mais mato, nem tem mais minha infância.O dia hoje continua difícil, áspero, triste. Sempre achei a chuva triste, mas também é confortante. Cobertor, pipoca e chocolate quente. A janela do quarto cheinha de pingos, lágrimas de Deus. Já não sei se escorrem dos meus olhos ou pelo vidro da janela.Penso nos dias que se foram. Não se lida com o passado. Melhor deixá-lo onde está. Ou sofremos porque a felicidade é finda ou pelas feridas que estão sempre abertas.Hoje não dá nem pra tomar banho de chuva. A chuva é fina e fria, penetra os ossos e atinge o espírito. Nem tento. Nem penso. Ou melhor, penso.Mas afasto o pensamento. Melhor ficar aqui dentro.Protegida, mas sozinha.

Danielle Gomes